Sinopse
O olho mais azul nos apresenta Frieda, Cláudia e Pecola, três crianças negras vivendo no subúrbio de Lorain, em Ohio. Frieda e Cláudia são irmãs, e durante um certo período, dividem a casa, o quarto, e a cama com Pecola, uma garota de vida difícil e sonha em ter olhos azuis.
Resenha
O olho mais azul foi o romance de estreia de Toni Morrison, autora laureada com o Nobel de Literatura em 1993, sendo a primeira mulher afro-americana a ganhar o prêmio.
O livro é dividido em quatro partes, cada uma marcada por uma estação do ano. Na primeira delas, Outono, Cláudia, a irmã caçula de Frieda, narra como Pecola foi parar na casa delas – uma espécie de abrigo temporário depois que o pai, Cholly Breedlove, pôs a família inteira para a rua – e um episódio que apresenta o grande tema deste livro: a estética.
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As garotas ganham de presente de Natal uma boneca loira, de pele clara, nariz fino e olhos azuis, totalmente o oposto da aparência que elas viam quando se olhavam no espelho. Vem então o primeiro conflito relacionado a questões de identidade e de referência. Cláudia odiava a boneca tanto por não se parecer com ela quanto pela imposição de um instinto materno que ela não tinha nem por uma brincadeira infantil.
“O presente grande, especial, dado com muito carinho, era sempre uma Baby Doll grande, de olhos azuis. Pela tagarelice dos adultos, eu sabia que a boneca representava o que eles pensavam que fosse o meu maior desejo. Fiquei pasmada com a coisa e com a aparência que tinha. Eu devia fazer o que com aquilo? Fingir que era a mãe? Eu não tinha interesse por bebês nem pelo conceito de maternidade”.
Em Inverno, conhecemos Maureen Peal, uma garota nova que é tratada de forma diferente pelas outras crianças da escola por ter a pele mais clara. A própria Maureen se acha especial por esse motivo; menos negra, quase branca. Prontamente, adquiriu uma certa antipatia das irmãs Frieda e Cláudia.
“E o tempo todo sabíamos que Maureen Peal não era o Inimigo e não merecia ódio tão intenso. A Coisa a temer era a Coisa que tornava bonita a ela e não a nós”.
Logo em seguida, como se fosse uma personagem que representasse quem seria Maureen no futuro, somos apresentados a uma mulher que se muda para a vizinhança e também se sente superior aos demais negros por não ser tão retinta. Uma mulher que negligencia a educação do filho porque tem mais afeição pelo gato de estimação e esse mesmo filho é mau comportado na escola, oprimindo e intimidando os outros alunos. O típico valentão americano em formação.
“Meninos brancos; a mãe não gostava que ele brincasse com pretinhos. Ela lhe havia explicado a diferença entre mulatos e pretos. Era fácil identificá-los”.
A Primavera, que por suas características talvez fosse nos confortar com episódios felizes, confronta o leitor com cenas fortes e crueis. Descobrimos o passado de Pauline Williams e como ela aos poucos foi se transformando na sra. Breedlove, mãe da Pecola e uma das personagens mais duras e amargas do livro. Também assistimos à história de Cholly e os traumas que ele carregou da infância até a vida adulta. Ambos falham como casal, como pais e como família. Tudo na vida de Pecola foi um desastre e as marcas da sucessão de episódios ruins são narradas no último capítulo, Verão.
Não é um livro fácil de se ler, a todo momento o leitor é apertado, ferido, machucado, e, ainda assim, a depender da perspectiva e contexto de cada um, não é nada perto do que os personagens vivem. Você é levado a expressar diversos sentimentos, como raiva, repugnância, empatia, tristeza e compaixão. Eu diria que em nenhum momento o livro proporciona alegria, então não espere por um final feliz – tampouco por um começo ou um meio feliz. Tudo em O olho mais azul é construído para incomodar você.
Por falar em construção, um ponto negativo, em minha opinião, é o formato que a autora escolheu para contar as histórias das personagens. Ela joga um episódio aqui, outro acolá, puxa um personagem nesta parte, larga naquela outra, esquece um mais lá adiante ou introduz um novo sujeito sem nenhum gancho. Particularmente, não gostei e senti falta de uma unidade narrativa. Arrisco que eu poderia me conectar mais com a obra se não me sentisse tão “solta” no meio dela.
Foi o meu primeiro contato com Toni Morrison e confesso que esperava mais de um livro sobre o qual eu tinha uma boa expectativa. Porém, gosto de como o tema da estética foi trabalhado, sob várias perspectivas, e de como a narração nos apresenta novos pontos de vista sobre identidade e autoimagem.
Sobre o autor
Toni Morrison, nascida Chloe Ardelia Wofford, nasceu em 18 de fevereiro de 1931 em Lorain, Ohio, EUA, e faleceu em 5 de agosto de 2019. Filha de uma família afro-americana de classe trabalhadora, cresceu ouvindo histórias e contos populares, que mais tarde influenciaram sua escrita. Estudou Letras na Universidade Howard, em Washington D.C., e um mestrado em Literatura Inglesa na Universidade Cornell. Morrison se tornou a primeira editora negra da Random House, uma das maiores editoras dos EUA, na qual trabalhou para dar visibilidade a escritores negros.
Sobre o livro
Título: O olho mais azul
Autor: Toni Morrison
Ano: 2019
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 224
Avaliação: 3/5
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