fbpx
  • Contos

    [Conto] Como nossos pais

    Houve uma época da minha vida em que eu tinha sonhos inusitados. A primeira vez aconteceu naquele verão em que viajamos para o litoral. Eu morava a trezentos quilômetros da cidade dos meus pais e, sempre que podia, visitava-os nos feriados. Era carnaval, e escolhemos uma pousada simpática, longe dos blocos de rua e perto do barulho das ondas. Sentados na areia, eu conversava com meu pai quando minha mãe voltou de algum lugar com cinco pequenas e bonitas conchas nas mãos, animada e se achando sortuda por ter encontrado não conchas quaisquer, mas conchas peroladas, com listras marrons e uma ou outra de um laranja brilhante. Eram realmente lindas,…

  • Bastidores

    A sujeira embaixo do tapete

    Aos dez anos de idade, em certa ocasião, levei um “puxão de orelha” da diretora da escola na frente da turma inteira. Ela era uma mulher alta, negra, de cabelos crespos curtos e com fama de durona. Aliás, era por causa dela que os pais escolhiam aquela escola, por manter os alunos na linha. Mas naquele episódio eu não havia feito nada (nem em qualquer outro, pois sempre adotei o estilo boazinha) e fui punida com uma humilhação em público. A vergonha diante dos colegas se misturou com a indignação do castigo injusto e eu vivi a minha primeira experiência com o rancor. Eu não acredito que os signos possam…

  • Para Leitores

    Como marcar livros – técnica do grifo

    Este é o primeiro artigo de uma série de publicações em que eu explico como faço uma leitura ativa nos meus livros. Por leitura ativa podemos entender como a leitura em que se interage com o texto por meio de grifos, marcações e anotações, explorando o conteúdo de modo mais efetivo.  Técnica do grifo Grifar o texto é talvez a prática mais comum entre os leitores. Usada para destacar partes importantes, citações que chamam atenção ou trechos que serão usados em outros materiais.  Para livros de ficção e não ficção, utilizo um marca-texto, uma caneta de ponta fina (no estilo das Stabilo) e uma caneta comum, aplicando de forma diferente…

  • Bastidores

    #30 Daqui para frente sem olhar para trás

    Há mais de um ano venho me preocupando com o dia do fatídico aniversário de 30 anos. Foi ontem. Um dia comum em que fiz faxina em casa, terminei a leitura de de um livro, cozinhei apenas para mim, vi TV, arrumei-me e saí para encontrar os amigos. Mas também fiquei triste, senti-me solitária, dei brecha para uma crise de ansiedade e me vi desesperançosa.  Em um O Grande Gatsby, Nick faz a seguinte reflexão no dia do seu aniversário: “Trinta anos… a promessa de uma década de solidão, um número cada vez menor de amigos solteiros, cada vez menos esperanças, os cabelos começando a cair… Porém, do meu lado…

  • Bastidores

    #29 Diversão

    Nunca gostei de baladas, de festas e de bebidas, entrei na juventude com o espírito morno de quem acha a música alta demais, o lugar cheio demais e o conforto menos demais. Definitivamente, horas em pé não é para mim – mas ainda me submeto vez ou outra em um show de um artista do qual eu gosto. Sempre preferi os lazeres que convidam à contemplação. Cinema, literatura, espetáculos de teatro, atrações em que você precisa estar atento para se entreter. Não digo que são melhores ou piores do que as baladas, são apenas diferentes. Para algumas pessoas, o êxtase está em sacudir o corpo no ritmo da batida e…

  • Bastidores

    #28 Uma nuvem no céu

    O dicionário conceitua epifania como percepção do significado essencial de alguma coisa, ou pode ser compreendido também como manifestação ou aparição divina. Ouso dizer que tive uma epifania quando olhei para uma nuvem no céu e senti mais do que nunca a presença de Deus. Parece meio cartunesco inferir que Deus está sentado sobre uma nuvem, mas aquela foi uma visão muito clara para mim de que Ele estava por perto. Nem sempre mantive uma vida religiosa. Por muito tempo, fui aquele tipo de sujeito que dizia “basta ser uma pessoa boa, não precisamos de Igreja para isso” seguido de uma risadinha soberba e vazia. Vazia porque hoje eu sei…

  • Bastidores

    #27 Agora e na hora de nossa morte

    Quando “Tempo perdido”, de Legião Urbana, toca em um show, churrasco, barzinho, ou karaokê, cantamos a plenos pulmões que temos todo o tempo do mundo, que somos tão jovens… e por um breve instante acreditamos mesmo que temos e que somos. Para mim, o devaneio dura o exato tempo da música porque um dos fatos que tem estado claro à minha frente é que nós não temos tanto tempo assim, quanto mais todo o tempo do mundo, e não se é jovem para sempre. Leia também #26 A empatia que me falta Na Ave-Maria, nós dissemos rogai por nós agora e na hora de nossa morte, os únicos dois momentos…

  • Bastidores

    #26 A empatia que me falta

    Considero-me um ser humano razoavelmente empático, mas muito pouco dessa empatia é dirigida a mim mesma. Eu diria que quase nada.  Desde quando eu compreendi que meus resultados são consequências diretas do meu esforço – combinado com um pouco de sorte ou da falta dela – eu passei a me cobrar e me punir de maneira bastante rígida. Você não pode passar a mão na sua própria cabeça. Faça as coisas direito. Assim não vai conseguir. Não faz nada certo. Tão carrasca quanto a Sra. Trunchbull em Matilda.  Leia também #25 De repente a vida real Toda essa rigidez é receio de acabar no outro extremo, a zona de conforto…

  • Bastidores

    #25 De repente a vida real

    De toda a vida que idealizei ter aos trinta anos, os únicos pontos que se concretizaram foi ter conseguido um emprego por meios próprios – e não por agrados feitos a quem eu não gostaria de agradar – e ter acesso à leitura e tempo para ler. Porque isso também é uma conquista, quiçá um privilégio. A minha pequena biblioteca pessoal é modesta, cerca de cinquenta ou sessenta títulos, mas poder adquirir os livros que quero e até mesmo investir em uma edição melhor é fruto do poder aquisitivo que nem sempre fez parte da minha vida. Quando mais nova, um dos meus sonhos era poder comprar livros e hoje…

  • Bastidores

    #24 O dia em que tudo começa pra valer

    O evento que marcou a minha transição da juventude para a vida adulta foi perceber que seria eu por mim mesma até que as circunstâncias viessem a se alterar. Já não era mais obrigação dos meus pais prestar qualquer tipo de assistência e eu não tinha um companheiro, então tudo, absolutamente tudo, dependeria apenas de mim.  Na infância, os pais levam você até determinados lugares, cuidam da sua segurança, preocupam-se com o que você vai vestir, comer e como vai voltar para casa. Depois que cresce, você precisa pensar em cada detalhe desses, não pode apenas sair caminhando esperando que tudo se ajeite. Naturalmente, muitos de nós anseiam pela fase…

Sabryna Rosa