Havíamos acabado de nos sentar à mesa para o almoço. Demos as mãos e meu pai agradeceu pela comida. Assim que as pontas dos dedos se soltaram e abrimos os olhos — o cheiro do frango envolvendo as narinas e atiçando o estômago —, a campainha tocou. Minha mãe detestava receber visitas na hora das refeições, mas se alguém chegasse, ela prontamente colocava um lugar na mesa.
Meu pai se levantou para atender e minha mãe foi buscar mais um prato. Meu irmão e eu tivemos uma pequena discussão em voz baixa pelo pedaço mais suculento do frango. Em voz baixa porque se o pai ouvisse, estaríamos em apuros. Era terminantemente proibido brigar por comida. Então, enfiei um garfo, meu irmão enfiou outro e, bem na hora em que eu venceria a disputa, notei que a visita não nos era familiar. Quero dizer, não era a vó, nem a tia, nem o primo, que dava uma passada por ali quando a tia cozinhava peixe para o almoço.
Olhei para o corredor — sem soltar meu garfo, era crucial mantê-lo no lugar — e vi minha mãe, com um prato na mão e a expressão intrigada, encarando a porta de entrada da nossa casa. Ela carregava um pano sobre os ombros e segurava as bordas da louça com os dedos bem firmes, como se a louça pudesse cair e se espatifar a qualquer momento. Daquele ângulo, eu não conseguia ver e nem ouvir meu pai, mas uma voz feminina se sobressaiu.
Voltei minha atenção para o frango e meu irmão ainda tentava tomá-lo de mim, mas permaneci firme na batalha até que minha mãe veio até nós com passos pesados e puxou os garfos de nossas mãos. Ela mesma dividiu o frango e nenhum de nós ficou com o pedaço que queria.
Havia algo nela que ia além do simples aborrecimento pela nossa picuinha boba. Seus olhos diziam que uma situação muito mais grave acontecia do outro lado da parede. Então, ela sumiu em direção à porta e ouvimos vozes entrecortadas umas pelas outras.
Meu pai pedia que ela se retirasse. Ela quem? Minha mãe ou a mulher?
De repente, um corpo estranho avançou e surgiu à nossa vista. Era uma mulher nem muito bonita, nem muito feia, mas visivelmente cansada, como se tivesse viajado a pé de outro estado até o nosso. Mais tarde, eu descobriria que ela realmente viajara, mas de ônibus. Uns dois dias e meio.
Notei que minha mãe havia deixado o prato na beirada da mesa — antes de decidir o embate pelo frango — e agora ele realmente poderia cair. Então, levantei-me e estendi a mão para colocá-lo no lugar à esquerda dela, onde provavelmente a visita se sentaria. Mas antes que eu pudesse concluir minha operação, minha mãe gritou para que eu não tocasse no prato. E gritou tão alto, tão urgente, que o susto me fez derrubá-lo. O barulho da queda intensificou a tensão e meu pai veio ver o que havia acontecido. Tudo isso — o aparecimento da mulher, o prato na beirada da mesa, o grito da mãe, a queda do prato e o surgimento do pai — aconteceu em menos de um minuto. E em menos de um minuto eu me vi preocupada se ficaria de castigo pelo frango e pelo prato. Minha mãe estava tremendo e não era por nenhum dos dois motivos.
Meu pai tocou o braço da mulher e apontou para a porta da rua, pedindo que ela fosse embora, mas ela se desvencilhou e se aproximou da mesa. Olhou para nós, para a comida, especialmente para o frango. O frango tinha mesmo algo de especial, por isso era tão importante não desistir do melhor pedaço.
Ela encarava o frango de um jeito esquisito — não com desejo, não reconhecendo sua apetitosidade, mas com indignação, como se tivéssemos roubado o frango da mesa dela e trazido para nossa casa. Por um instante, na minha mente infantil, achei que o motivo daquela cena embaraçosa fosse exatamente esse: adultos brigando pelo frango, como eu e meu irmão. Meu pai teria comprado o melhor frango do supermercado? Ou talvez fosse o último disponível e ele pegou primeiro? Eu não entendia a situação, mas a mulher estava enraivecida, minha mãe chorava e meu pai não sabia o que fazer.
Em seguida, ela nos encarou — aquelas duas crianças ansiosas para almoçar, frustradas com seus pedaços de frango, esperançosas de que ainda houvesse um pouco de sorvete de tapioca — e ela ali, pisando nos cacos do prato e nos constrangendo.
Naquela idade, eu não sabia o que a palavra “constranger” significava, mas, quando volto para aquele dia, sei que me senti assim: constrangida.
Mais uma vez, meu pai tentou tirá-la de nossa casa, e, desta vez, eu me compadeci da mulher. Talvez ela pudesse ficar para o almoço; que mal faria? Mas o problema dela não era bem uma refeição, era com meu pai.
Ela esbravejou palavras que me fariam ficar de castigo se as repetisse. Ela chorava de desespero de um lado, minha mãe chorava de tristeza do outro. Meu pai, a muito custo, mantinha os próprios gestos controlados. Nos nossos pratos, o frango esfriava.
Aquele foi o nosso último almoço de domingo em família. Quero dizer, daquele jeito, com meu pai, minha mãe, meu irmão e eu sentados à mesma mesa. Daquele ponto em diante, almoçávamos em domingos alternados com o pai, e não mais apenas nós três.
Nós três e uma meia-irmã — uma garota mais ou menos da minha idade, que usava óculos muito grandes e quase não abria a boca. Nos primeiros domingos, me perguntei se teria que disputar o frango com ela também, mas meu pai não sabia preparar frango, então ele comprava uma lasanha congelada, cujos pedaços todos tinham o mesmo gosto de creme de leite.
Minha mãe foi morar com minha vó e nós passávamos uma semana com elas e outra semana com meu pai. A outra garota aparecia de vez em quando. Não voltei a cruzar com a mulher até muitos anos depois, quando a vi por acaso no supermercado. Ela ainda carregava aquele mesmo semblante de quem havia viajado a pé.
Ela não me reconheceu, mas eu a reconheci, principalmente ao vê-la naquela posição, escolhendo os frangos no freezer. Enquanto eu fingia que escolhia salsichas, observei a mulher até entender que a cena daquele almoço foi como se ela e minha mãe disputassem o mesmo pedaço de frango, mas minha mãe cedeu primeiro — seja porque deixou de desejar ou porque decidiu que não valia a pena. Mas depois a mulher também não quis, e o frango delas ficou lá, esquecido na bandeja, esfriando e perdendo o brilho.
E, mais do que nunca, na casa do meu pai era proibido brigar por comida.
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