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Bastidores

Como fui de leitora a escritora

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Comecei a ler com três anos de idade. Éramos apenas eu, minha mãe e meu pai. Minha mãe, que sempre foi professora, ficava a maior parte do dia comigo e tratou logo de me ensinar as primeiras palavras. Comprou revistas em quadrinhos e em pouco tempo eu já conhecia toda a Turma da Mônica.

Nessa época erámos nordestinos morando em São Paulo por causa da oferta de emprego que era maior. Quando voltamos ao Maranhão eu, com cinco anos, fui para a escola pela primeira vez, já um pouco adiantada dos coleguinhas porque sabia ler e escrever. Esse intervalo entre o jardim de infância e o ensino fundamental não é muito claro para mim, por razões óbvias, mas lembro perfeitamente de um dia especial quando cada aluno da minha turma ganhou uma coleção de livros na quarta série, e de como aquilo me deixou feliz.

Muitos, muitos anos depois, ano retrasado para ser mais exata, eu descobri que essa coleção veio de um projeto do governo federal. E sempre conto desse dia para todo mundo porque naquele tempo e hoje, e sempre, é disso que precisamos, de projetos que incentivem a leitura na infância. A justificativa daria um artigo científico, uma tese de doutorado, ou eu poderia pegar meus slides agora e falar disso com vocês por dois dias seguidos. Mas sigamos em frente.

Conheça meus livros

Um desses livros era a versão condensada, e simplificada, de Os Miseráveis. Até hoje nunca li a versão original (não me falta vontade) e até hoje a história continua viva e magnífica na minha cabeça. Imaginem! Ler Os Miseráveis na quarta série! Eu reli esse livro tantas e tantas vezes que perdi as contas. Assim como O Fantástico Mistério de Feiurinha, Pandonar – o Cruel, e muitas outras histórias que eu descobri nessa fase.

Até o dia que encontrei A Droga da Obediência, de Pedro Bandeira.

A oferta de livros na minha cidade natal, uma cidade do interior do Maranhão, era e ainda é muito pequena. Não há livrarias, na minha escola não tinha biblioteca, e a biblioteca municipal era um pouco carente de livros não didáticos. Então só me restava pedir emprestado aos colegas de escola e vizinhos de rua os livros que eu torcia para que eles tivessem. Qualquer um, eu não podia fazer muitas exigências afinal.

A Droga da Obediência foi um livro emprestado. Eu fiz esse empréstimo mais de uma vez até que ele foi ficando lá em casa, ficando, ficando, e ficou. Hoje em dia cumprimento o dono na rua rezando para ele não se lembrar de pedir de volta o livro que me emprestou há mais de quinze anos.

Eu fiquei fascinada com Os Karas. O mistério, a aventura, o plot twist no final. A surpresa de saber que aquele molho de chaves mudou todo o rumo da história ainda me arrepia até hoje. Ler aquele livro me deu uma vontade de escrever outro tão incrível quanto. De imaginar um grupo de amigos correndo atrás de vilões inescrupulosos, de criar a atmosfera de suspense, de dar vida aos personagens, de pensar em seus nomes, suas aparências, tudo! Eu pensei: que universo sensacional onde tudo pode acontecer!

E foi assim que tudo começou. Hoje, eu não escrevo suspense, mas continuo amando Os Karas e Pedro Bandeira. Na verdade, lhe devo minha vida de escritora. Continuo apaixonada por thrillers e por todos os outros livros que existem na face da Terra. Como fui de leitora a escritora? Lendo na infância e tendo a oportunidade de conhecer Os Miseráveis porque alguém se dispôs a adaptar uma versão para crianças. Porque outras pessoas pensaram em doar coleções para crianças de escolas públicas.

Eu não sei o contexto político ou educacional disso, não sei se foi uma iniciativa para cumprir metas ou por pura obrigação tributária, eu só sei que é por isso que eu escrevo, é por isso que eu leio. Porque me foi dada a oportunidade de saber o que era a literatura.

Escritora, jornalista e leitora assídua desde que se conhece por gente. Escreve por achar que a vida na ficção é pra lá de interessante.

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Sabryna Rosa