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Bastidores

#1 Do que eu me lembro quando me lembro de ser criança

Quando exatamente eu deixei de ser criança? Talvez se puxar um pouco na memória eu até sei. Foi no dia em que desenhamos uma amarelinha no chão e ninguém quis mais brincar. 

Havia duas garotas mais velhas na nossa turma e elas já não participavam das brincadeiras conosco. Elas se sentavam em um canto, cochichando e esperando aquele menino passar de bicicleta. Lembro-me dele. Magro, cabelo loiro bagunçado e o rosto com muitas espinhas, como um adolescente comum. Acho que uma garota deixa de ser criança no dia exato em que não quer mais brincar para não se desarrumar. Como diz a música, toda menina que enjoa da boneca é sinal que o amor já chegou no coração. Naquele dia, especificamente, eu ainda queria muito brincar.

Por volta dos meus cinco anos, em algum lugar entre São Paulo e o Maranhão, eu esperneei para que minha mãe comprasse uma revistinha da Mônica para mim porque toda a minha coleção havia ficado para trás, na mudança. Pensando bem, nestes vinte e poucos anos entre aquele dia e a minha vida agora, eu não voltei a comprar nem um só gibi.

Na escola, fui uma aluna sobre a qual os professores e os pais tinham muitas expectativas e acho que não correspondi a um terço delas na minha caminhada acadêmica. Tenho clareza de que não tinha nada de especial, apenas era uma criança que gostava de ler e de escrever.

Ter estudado em uma escola paroquial me deu as raízes católicas das quais eu precisaria na vida adulta. Cantar “Mãezinha do céu, eu não sei rezar, só sei é dizer que eu quero é te amar…” me leva a voltar no tempo e ver aquela menininha com saia de pregas na fila no meio do pátio da escola. Na minha memória, aquele pátio é enorme, mas certamente não é e eu não sei se quero voltar para lá para ver o real tamanho que ele tem.

Não tenho memórias de viagens porque não tínhamos dinheiro para isso. No máximo, comer em uma lanchonete de esquina de vez em quando. Não reclamo, era o que o meu pai podia fazer e ele fazia com muito gosto. Tirou muito de si para dar a mim e meus irmãos.

Quando criança, eu já adorava filmes, mas odiava musicais. Gostava muito daquele desenho dos dinossauros e não via a menor graça em Dragon Ball Z. Até a minha adolescência eu ainda tinha uma camiseta do Bob Esponja.

Parando para pensar, acho que uma coisa boa da minha infância foi ter sido criança até onde deu, sem reduzir nenhum dia. Enquanto me foi permitido ser, eu fui.

Escritora, jornalista e leitora assídua desde que se conhece por gente. Escreve por achar que a vida na ficção é pra lá de interessante.

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Sabryna Rosa