Resenha
Premiada com o Nobel de Literatura em 2009, Herta Müller reúne nesse livro uma coletânea de ensaios sobre sua vida de enfrentamento e resistência à ditadura romena. Perseguida, investigada, suspeita, Herta rebateu o regime com sua melhor arma: a literatura.
Sinopse
Talvez essa resenha fique curta para o que foi de fato a leitura desse livro para mim. Acontece que prefiro me preservar nas palavras do que correr o risco de dizer coisas que não estão à altura da obra de Herta.
O regime do ditador comunista Nicolae Ceausescu durou anos no país e durante esse tempo Herta foi recrutada como espiã e ameaçada de morte depois da sua recusa. Do outro lado, era afastada dos colegas de trabalho por acharem que ela tinha, de fato, aceitado espionar. Enquanto isso ela e os próximos lidavam com o medo constante, a vigilância repressiva, os interrogatórios frequentes e o medo da morte, que era real.
“[Saudação] A literatura fala com cada um individualmente – ela é propriedade privada que permanece na cabeça. Nada mais fala de maneira tão incisiva conosco que um livro. E não espera nada em troca, exceto que pensemos e sintamos”.
Nos seus textos Herta traduz toda essa atmosfera em frases às vezes complexas, mas às vezes tão simples que nos arrebata pela poesia e metáforas certeiras. As palavras que ela escolhe para dar o tom são de uma genialidade e inteligência incrível. Ela quer nos contar o que aconteceu, quer contar para o mundo, quer externar, gritar, mas, por outro lado, parece que não quer nos chocar. Quer preservar o leitor da brutalidade escancarada. E para isso ela abre as próprias feridas, mas aguenta firme na dor.
A mãe de Herta passou cinco anos em trabalhos forçados na União Soviética, e seu pai fora membro da SS, o que fez com que ela alimentasse a figura do Estado como um inimigo, como uma sombra que rondou sua vida, escureceu o céu e impediu o sol de entrar. Um dos trechos em que isso fica claro é quando ela diz que lia os seus livros da maneira mais rápida possível, os engolia sem mastigar porque a qualquer momento um agente do governo poderia entrar e levá-la, e ela nunca saberia se iria voltar depois e terminar aquele livro.
“[Na beirada da poça cada gato pula de um jeito diferente] Um dos meus amigos que cometeu suicídio gostava mais de viver do que eu e todos os amigos juntos. Ele procurava mais do que eu pela felicidade. Ao saltar pela janela, ele não procurou pela morte, mas apenas pela saída da infelicidade constante da vida. Quero não me esquecer dessa diferença”.
Herta se exilou na Alemanha, onde também sofreu desconfianças, e seguiu sua vida denunciando um regime que tanto roubara dela e dos seus. Os amigos e personagens que aparecem em seus textos foram embora, alguns por atos externos, outros por atos próprios, e tudo que ela podia fazer era continuar escrevendo. Por isso seus textos são tão vivos e reais, porque ali está a história do lado que testemunhou e sobreviveu para contar o que viu.
Sem dúvidas Sempre A Mesma Neve e Sempre O Mesmo Tio merece uma releitura, mas também quero conhecer a obra inteira de Herta e absorver pelo menos um pouco de tudo que ela tem a dizer.
Sobre a autora
Nasceu em 1953, na Romênia, e é escritora, poeta e ensaísta. Ainda jovem foi perseguida pelo governo de Nicolae Ceausescu ao recusar-se a colaborar com o serviço secreto e precisou mudar-se para a Alemanha, onde vive desde 1987 (Fonte: Site Companhia das Letras)
Sobre o livro
Título: Sempre A Mesma Neve e Sempre O Mesmo Tio
Autora: Herta Müller
Editora: Biblioteca Azul
Ano: 2012
Páginas: 248
Avaliação: 5/5
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