Há um comportamento comum em crianças pequenas que se apresenta na seguinte cena: ela diz que gostaria de comer uma banana, então um adulto entrega a banana a ela, inteira e com casca, e, a depender da idade, com as próprias mãozinhas ela abre o envelope amarelo e come; às vezes, a criança recebe a banana descascada, porém inteira, e recusa, pois seria melhor se estivesse cortada, então o adulto corta a fruta em rodelas; o pequeno ser humano esperneia porque os pedaços são muito grandes e devolve o prato, recebendo de volta com pedaços menores; não satisfeita, ela diz que quer mesmo é a banana amassada. Ao ver na sua frente aquela substância pastosa e esbranquiçada, ela entorta os lábios e diz que não quer mais a banana de jeito nenhum.
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Talvez alguns de nós aborrecemos nossos pais com birras iguais ou semelhantes a essa e, ao longo da vida, continuamos birrentos, às vezes tendo com quem reclamar, às vezes nos queixando para o próprio espelho do banheiro, todas as noites, ao escovar os dentes antes de dormir.
Queríamos aquele tênis da moda e depois que a mãe parcelou em doze vezes, não pareceu mais tão bonito assim; queríamos um emprego para comprar nossos próprios tênis, mas o que conseguimos paga pouco demais, é longe demais, cansativo demais; pedimos demissão e entramos na faculdade, no curso dos sonhos, mas dois anos depois percebemos que não era bem aquilo que queríamos; mudamos de curso uma, duas, três vezes, até se convencer de que um diploma não é tão importante assim, então vamos atrás de outro emprego ou voltamos para aquele primeiro, do qual reclamaremos a vida inteira. Passamos anos sonhando com a casa própria e quando finalmente o banco aprova o financiamento, o bairro é muito longe, os vizinhos muito barulhentos, o piso muito feio. Então trocamos o piso, discutimos com os vizinhos, mudamos de casa. Escolhemos uma cor nova de cabelo e uma semana depois parece a pior escolha que poderíamos ter feito. Assim como aquele carro que compramos de segunda mão, a SmarTv com um sistema ruim, o restaurante que fomos naquele fim de semana.
E assim vamos vivendo, bambeando na linha tênue entre o azar das escolhas ruins ou o amargor da ingratidão.