A pauta da semana na bolha dos leitores é a lista dos melhores livros brasileiros do século que a Folha de S. Paulo publicou há alguns dias. A partir da eleição de professores, donos de livrarias, críticos e outros profissionais do mercado editorial, 25 títulos compuseram uma seleção que gerou alguns burburinhos. Elaboro este texto a partir de um desses comentários.
Um determinado leitor apontou a presença significativa da editora Companhia das Letras, que, segundo ele (eu não fui conferir a informação, espero que não cancelem minha carteirinha de jornalista, esse número apenas não é relevante para o que eu quero abordar aqui), publicou 17 dos 25 livros eleitos. O autor do comentário expressou incômodo com o domínio da marca e disse que isso é prejudicial porque praticamente dita o que o leitor nacional vai ler. Em outras palavras, que estaríamos à mercê da linha editorial de uma única empresa.
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É certo que a Cia das Letras é uma das grandes editoras do Brasil. É quase a Coca-Cola do mercado editorial. Onde quer que você vá, encontrará um livro deles para vender. Assim como tantas outras de tamanho expressivo, como Record, Editora 34, L&PM e Martin Claret, para citar apenas as que estão à vista aqui na minha estante enquanto escrevo este artigo.
Eu entendo, e até concordo, com a crítica do rapaz, mas eu prefiro olhar a questão sob um olhar micro do que sob o macro. Apesar de não ser uma grande fã da linha editorial da Cia das Letras, acho que as edições de alguns livros, principalmente dos clássicos, são de qualidade e, a depender do título, quase sempre dou preferência ao catálogo deles do que de outras editoras. Contudo, embora a presença da marca seja massiva nas livrarias e sites, ela está longe de ditar o que eu leio porque eu assumo a responsabilidade de construir o meu próprio interesse literário.
No Brasil, existem centenas de editoras, a maioria delas longe dos holofotes, mas não por isso ruins. Editoras de vários nichos, com várias propostas, e que fazem um excelente trabalho, mantendo-se vivas o quanto podem. O mercado editorial brasileiro é cruel com todas as partes do processo, do escritor ao leitor; é impiedoso com os grandes e ainda mais com os pequenos; mas muitos resistem e publicam bons títulos.
Sabendo disso, e tendo eu um interesse particular em conhecer novas publicações, procuro outros caminhos para conhecer o que vem sendo publicado e não muito divulgado. Sigo diferentes perfis no Instagram, assisto a outros canais no Youtube, leio alguns portais especializados, fico de olho nos prêmios literários, e assim, aos poucos, vou me informando dos acontecimentos fora da ponta da pirâmide.
Se você, leitor, frequentar (ainda que online) os mesmos espaços de sempre, naturalmente vai ouvir falar apenas dos grandes porque isso é próprio de todo nicho de mercado. A Companhia das Letras tem mais dinheiro para colocar seus autores na vitrine das livrarias, então, se quiser conhecer outros, você terá que andar um pouco mais para o fundo do corredor.
A Record, a L&PM, a Zahar, têm mais dinheiro para pagar a publicidade de influencers, logo, se você quiser saber o que outras pessoas estão lendo, terá que seguir perfis com menos seguidores.
De minha parte, sempre achei enfadonho ver todo mundo na internet, ou no mundo real, ler a mesma coisa. Parece que eu mesma já li todos os livros da moda de tanto ouvir falar deles. Interessa-me conhecer um livro que foi trazido do Paquistão e ninguém nunca ouviu falar, mas que é uma excelente história. Quero ler também um livro que foi editado no início dos anos 2000, por uma editora que nem existe mais, e entro em um sebo à procura de alguma capa amarelada que vai me proporcionar uma ótima experiência de leitura.
Importante ressaltar também que eu não tenho medo de ler livros não indicados, então se ninguém está falando sobre algum título, eu não perco a vontade de conhecê-lo.
Não podemos mudar a lógica capitalista – e eu, particularmente, nem quero -, as coisas são o que são, e entre as coisas que são, está o fato de que a Cia das Letras, enquanto tiver um bom capital de giro, estará nos topos de venda. Mas nem por isso você é obrigado a ler apenas o que ela publica. Tenha curiosidade, interesse, por mais que dê um pouco mais de trabalho. Vale a pena, vai por mim.
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