Segundo o Dicionário Michaelis, perfeccionismo é a exigência exagerada de perfeição em relação a si mesmo ou aos outros. Quando aplicado à escrita, ou a qualquer outro projeto, o perfeccionismo é aquele incômodo que impede você de finalizar, ou de publicar, o seu livro. Nunca está bom o suficiente para ser entregue aos leitores. Neste artigo, eu enumero 5 dicas para superar o perfeccionismo e concluir seus projetos de escrita. 1. Entenda que rascunho é rascunho A importância de aceitar a imperfeição no início A primeira versão do seu texto não precisa ser perfeita. Ou melhor, é proibido ser perfeita; justamente porque é o rascunho. É naquele texto que as…
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Janelas
Entre o fim de fevereiro e o início de março, eu mudei de apartamento. Mudanças não são o meu forte, em nenhuma categoria. Gosto de morar no mesmo bairro (meu endereço ainda é na mesma rua), de trabalhar no mesmo horário, dos móveis no mesmo lugar, de malhar na mesma academia e de pegar o mesmo caminho pra ir e vir – embora esse não seja o melhor recurso de segurança quando se mora em uma cidade como a minha. Mas, por força das circunstâncias, não foi possível permanecer no mesmo apartamento e precisei encaixotar meus pertences e transportar de um imóvel para o outro. Na casa anterior, a primeira…
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O vento que nem sempre sopra
Quando você passa por um processo de conversão ao cristianismo — seja qual for a vertente —, é comum viver aquele momento em que sente o Espírito Santo envolver você de um modo tão forte que quase parece mágica. Você sente o êxtase, a alegria, a esperança, o amor de Deus, a fé — tudo passando pelo seu corpo como uma corrente elétrica de alta voltagem. E fica inebriado por dias, até meses, flutuando naquele mar de graça. Até que a corrente começa a deixar a sua pele, esvaindo-se pelos dedos, e você percebe que está voltando a ser o sujeito que era antes: um homem ou mulher comum, indo…
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[Conto] Almoço de domingo
Havíamos acabado de nos sentar à mesa para o almoço. Demos as mãos e meu pai agradeceu pela comida. Assim que as pontas dos dedos se soltaram e abrimos os olhos — o cheiro do frango envolvendo as narinas e atiçando o estômago —, a campainha tocou. Minha mãe detestava receber visitas na hora das refeições, mas se alguém chegasse, ela prontamente colocava um lugar na mesa. Meu pai se levantou para atender e minha mãe foi buscar mais um prato. Meu irmão e eu tivemos uma pequena discussão em voz baixa pelo pedaço mais suculento do frango. Em voz baixa porque se o pai ouvisse, estaríamos em apuros. Era…
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Suco de laranja
Talvez uma das situações mais difíceis de se viver na era das distrações seja aquele momento em que o sujeito precisa entrar em confronto consigo mesmo, iniciando e mantendo um embate com as próprias emoções. É fácil sentir alegria, saborear o sentimento de júbilo, porque o riso sai fácil, a musculatura do rosto está relaxada, o corpo não pesa e a alma não se comprime. Mas quando vem a tristeza, a angústia ou o desamparo, muito mais penoso é bater no peito e dizer “deixa vir”. Porque vem cheio de espinhos, queimando a pele, apertando o pescoço, beliscando, batendo, soprando frio, estremecendo o nosso interior sem que nada possamos fazer.…
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[Resenha] O Jardim Secreto – Frances Hodgson Burnett
Resumo Mary Lennox é uma garota de dez anos que nasceu e cresceu na Índia. Filha de pais ingleses ausentes, Mary é criada por empregados, mas desenvolve um comportamento mal-educado e distante. Quando um surto de peste bubônica a deixa órfã, ela é enviada à Inglaterra para viver com seu tio, um homem reservado que mora em uma enorme mansão cheia de mistérios, incluindo um jardim secreto. Resenha: O Jardim Secreto (Contém Spoilers) Uma leitura para ensinar virtudes A primeira característica que precisamos ter em mente sobre O Jardim Secreto é que se trata de um livro infantil, voltado para ensinar virtudes às crianças – na mesma linha de Mulherzinhas,…
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Resenha de Frankenstein: análise do clássico de Mary Shelley
Sinopse Victor Frankenstein, protagonista do clássico Frankenstein, de Mary Shelley, é um estudante de Ciências Naturais que ambiciona ultrapassar as descobertas científicas ao infundir vida em um corpo inanimado. Essa obra, também conhecida como Frankenstein ou o Prometeu Moderno, explora as consequências do orgulho e da busca pelo conhecimento sem limites. Resenha Por que Prometeu? O título que Mary Shelley deu ao livro é Frankenstein ou o Prometeu Moderno. Prometeu é uma figura mitológica que teria roubado o fogo do Olimpo para dar à humanidade, sendo punido por desobedecer às ordens de Zeus de privar os homens desse elemento. Em outra versão do mito, Prometeu criou um homem de barro…
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O descontentamento infinito
Há um comportamento comum em crianças pequenas que se apresenta na seguinte cena: ela diz que gostaria de comer uma banana, então um adulto entrega a banana a ela, inteira e com casca, e, a depender da idade, com as próprias mãozinhas ela abre o envelope amarelo e come; às vezes, a criança recebe a banana descascada, porém inteira, e recusa, pois seria melhor se estivesse cortada, então o adulto corta a fruta em rodelas; o pequeno ser humano esperneia porque os pedaços são muito grandes e devolve o prato, recebendo de volta com pedaços menores; não satisfeita, ela diz que quer mesmo é a banana amassada. Ao ver na…
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[Conto] Eu me sinto vivo
Estou deitado sobre um colchão desconfortável que não se parece em nada com o meu colchão. Lembro quando a Júlia me mostrou o encarte da loja de móveis e me falou sobre o quanto valia a pena investir em um bom colchão e eu fui categórico em negar, não havia a menor possibilidade de pagar aquele valor em uma cama. Mas quando ela insistiu e me levou até lá para que eu visse com meus próprios olhos, ou melhor, sentisse com meu próprio corpo… ah, tudo mudou. Ela tinha razão, valia a pena comprar um bom colchão, então eu não sei o que estou fazendo deitado neste aqui. Hoje é…
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[Conto] Como nossos pais
Houve uma época da minha vida em que eu tinha sonhos inusitados. A primeira vez aconteceu naquele verão em que viajamos para o litoral. Eu morava a trezentos quilômetros da cidade dos meus pais e, sempre que podia, visitava-os nos feriados. Era carnaval, e escolhemos uma pousada simpática, longe dos blocos de rua e perto do barulho das ondas. Sentados na areia, eu conversava com meu pai quando minha mãe voltou de algum lugar com cinco pequenas e bonitas conchas nas mãos, animada e se achando sortuda por ter encontrado não conchas quaisquer, mas conchas peroladas, com listras marrons e uma ou outra de um laranja brilhante. Eram realmente lindas,…